sexta-feira, 6 de julho de 2007

I look at you and smile because I'm fine now…

É estranho como as pessoas às vezes têm necessidades estranhas. Algumas têm necessidade de ficar triste mesmo sem motivo... Acontecia comigo às vezes. Não consigo entender o porquê de querer ficar triste, e nem tinha pensado no assunto até ler um texto (advinhem de quem!) que falava sobre isso...

Eu ficava procurando milhares de motivos, e sempre buscava no passado... Sim, porque o passado só pelo fato de ser passado já se torna triste... É como se eu quisesse sentir algo diferente no meu presente e buscasse inspiração no passado. O problema (? Ou seria a solução de outro problema?!) é quando nada no passado serve de inspiração e quando não consigo encontrar nenhum motivo pra chorar e tenho a necessidade de desabafar algo que não existe, crio na minha cabeça situações dignas de novela mexicana e consigo chorar, ou conseguia...

Conversando com uma amiga hoje sobre isso ela disse “às vezes é um jeito de lavar os pratos com a gente mesmo”... É, pode ser... Mas meus pratos acabaram, minha roupa suja também. Devo eu me ocupar agora em sujar algumas coisas pra limpar depois? Ou devo me contentar com a alegria mansa que se apoderou de mim? Ando me contentando com a 2ª opção, não estou com muito ânimo pra fortes emoções mesmo... Reservo as fortes emoções pra um momento mais propício, fortes emoções boas e duradouras!


E como não poderia deixar de ser, eis o texto:

“Pois a hora escura, talvez a mais escura, em pleno dia, precedeu essa coisa que não quero sequer tentar definir. Em pleno dia era noite, e essa coisa que não quero ainda definir é uma luz tranqüila dentro de mim, e a ela chamariam de alegria, alegria mansa. Estou um pouco desnorteada como se um coração me tivesse sido tirado, e em lugar dele estivesse agora a súbita ausência, uma ausência quase palpável do que era antes um órgão banhado da escuridão da dor. Não estou sentindo nada. Mas é o contrário de um torpor. É um modo mais leve e mais silencioso de existir.

Mas estou também inquieta. Eu estava organizada para me consolar da angústia e da dor. Mas como é que me arrumo com essa simples e tranqüila alegria. É que não estou habituada a não precisar do meu próprio consolo. A palavra consolo aconteceu sem eu sentir, e eu não notei, e quando fui procurá-la, ela já se havia transformado em carne e espírito, já não existia mais como pensamento.

Vou então à janela, está chovendo muito. Por hábito estou procurando na chuva o que em outro momento me serviria de consolo. Mas não tenho dor a consolar.

Ah, eu sei. Estou agora procurando na chuva uma alegria tão grande que se torne aguda, e que me ponha em contato com uma agudez que se pareça a agudez da dor. Mas é inútil a procura. Estou à janela e só acontece isso: vejo com olhos benéficos a chuva, e a chuva me vê de acordo comigo. Estamos ocupadas ambas em fluir. Quanto durará esse meu estado? Percebo que, com esta pergunta, estou apalpando meu pulso para sentir onde estará o latejar dolorido de antes. E vejo que não há o latejar da dor.

Apenas isso: chove e estou vendo a chuva. Que simplicidade. Nunca pensei que o mundo e eu chegássemos a esse ponto de trigo. A chuva cai não porque está precisando de mim, e eu olho a chuva não porque preciso dela. Mas nós estamos tão juntas como a água da chuva está ligada à chuva. E eu não estou agradecendo nada. Não tivesse eu, logo depois de nascer, tomado involuntária e forçadamente o caminho que tomei - e teria sido sempre o que realmente estou sendo: uma camponesa que está num campo onde chove. Nem sequer agradeço ao Deus ou à natureza. A chuva também não agradece nada. Não sou uma coisa que agradece ter se transformado em outra. Sou uma mulher, sou uma pessoa, sou uma atenção, sou um corpo olhando pela janela. Assim como a chuva não é grata por não ser uma pedra. Ela é uma chuva. Talvez seja isso ao que se poderia chamar de estar vivo. Não mais que isto, mas isto: vivo. E apenas vivo de uma alegria mansa.”

Tanta Mansidão - Clarice Lispector

~ Ouvindo The Killers - On Top

2 comentários:

Unknown disse...

nossa, parei aqui por acaso..
acabei lendo tudo isso.
e me identifiquei muito com vc..
poir muitas vezes.. sinto necessidade de estrar triste, ficar triste. Penso muito no meu passado tbm, talvez como consolo.. ou como sofrimento, não sei explicar ao certo.

Mas enfim, adorei o texto. ^^


beijos !

Clarissa disse...

Ô, menina!
Parei por acaso aqui também!
E como a amiga ali de cima, fico triste por nada, e choro tão sentidamente que parece uma criança que perdeu o doce. E o duro é que a gente nem sabe qual o doce que perdeu.

Mas acontece, mesmo quando não temos mais roupa suja. Acho que é só pra não deixar a água parada no cano. ^^

Beijo!